Espero que gostem. E que comentem.
Mockumentário
(mockumentary, mock-dock, pseudo-documentary):
Mockumentário
(mockumentary, mock-dock, pseudo-documentary):
Mock + Documentário: Que numa tradução livre seria imitação de documentário. O seu conceito é um novo estilo de cinema que se fortalece cada vez mais em Hollywood. Por grosso, é fazer um documentário de algo que não ocorreu na realidade. A linha da ficção e realidade mistura-se e confunde-se. Baralha os espectadores e até mesmo o próprio modo de ver e fazer cinema.
Parcialmente ou totalmente improvisado, com apenas umas linhas-guia do que fazer ou comportar perante tal situação, muitos deles não têm guião, o que leva a que o sentido de realidade seja mais apurado. Raramente contém banda sonora, usando apenas o som ambiente para sonorizar o filme. A música que se ouve no rádio do carro ou da aparelhagem, algum músico que toca acordes instrumentais, ou a cantar, etc. Tudo o que seria a nossa banda sonora na nossa vida real. O modo de como é filmado todo e qualquer acontecimento é uma das imagens de marca do Mock-Doc. É a câmara instável, quase amadora, hesitante em alguns momentos no registar a situação. É a imagem em bruto, rude e crua como mostra o desenrolar da acção. Geralmente é usado para um tom de sátira e comédia, tal acontece com assuntos mais banais da vida. Mas o mais frequente é quando envolve algum tipo de desastre ou catástrofe. Falsas reportagens noticiosas dadas por verdadeiros jornalistas são frequentes, incluindo entrevistas com peritos reais ou ficcionados. Na sua maioria, o mockumentário provoca grande polémica devido ao assunto que toca.
As origens de tornar uma ficção como realidade já vêm de longe. Orson Wells originou provavelmente o primeiro exemplo do género com a sua transmissão radiofónica sobre o War of the worlds de HG Wells, acontecimento que decerto toda a gente já ouviu falar. A BBC ela própria é hoje uma grande produtora deste tipo. Os mais recentes documentários focam sobretudo situações que “poderiam acontecer”, como exemplo supremo o já longínquo The War Game de 1965. Demonstrando o efeito de uma explosão nuclear numa cidade inglesa e suas repercussões, criou choque entre os espectadores da altura devido ao seu realismo nunca visto. Foi este filme que determinou o sucesso do formato para a BBC.
Mas só muito mais tarde o termo "mockumentary" apareceu, apenas nos anos 80 quando Rob Reiner descreveu assim o seu filme This Is Spinal Tap numa entrevista, história de uma banda fictícia filmado como que um documentário se tratasse. Essa era a criação de um novo género, longe dos clássicos formatados que Hollywood produziu desde os seus primórdios. Um filme já não se limitava em ‘acção’, comédia’, ‘drama’ ou ‘terror’ e os sub-géneros proliferaram através destes quatro gigantes. Mas o mockumentário pode ser até chamado de anti-género. Ele atravessa todos eles, dando-lhe o seu toque pessoal, quebrando as rígidas linhas do academismo Hollywoodiano. Forgotten Silver de Peter Jackson é um documentário presumindo-se “à séria”, enganando meia Nova Zelândia, ao fazer crer que um cineasta do tempo do mudo esquecido pelo público e crítica existiu realmente.
O estrondo ouviu-se em 1999, quando o fenómeno Blair witch project surgiu nos cinemas, apresentado ao mundo como as películas descobertas de um grupo de estudantes desaparecidos anos antes no bosque assombrado de Burkittsville. O sucesso do filme foi o momento-chave para este formato notado pelo seu mediatismo imparável tanto na tv como na internet. Na época a publicidade do filme foi feita como se as imagens fossem reais e os personagens realmente existissem. Todos caíram na armadilha...
Muitos outros se seguiram: Series 7 – The contenders, com um reality-show mortal versão Big Brother onde os concorrentes têm de se matar uns aos outros para ganhar. Até a série X-files lhe apanhou o gosto, com o episódio "X-cops" a divagar sobre os mitos urbanos e cultura pop de terror. Supervolcano narrava o que aconteceria se o vulcão de Yellowstone entrava em erupção, estilo blockbuster-documental, com direito a entrevistas aos intervenientes. Borat desbravou terreno. Onde começa a ficção e acaba a realidade? Muito do filme é apresentado como situações reais e é verdade que Sasha Baron Cohen levou com dezenas de processos (esses bem reais!) dos que involuntariamente lá aparecem. Kenny, filme australiano de 2006, consegue com uma ideia simples criar um filme sólido e divertido sobre a profissão mais inglória do mundo: Limpeza de retretes.
Death of a President, um mockumentário altamente controverso de 2006 apresentado como tendo sido produzido em 2008, detalhando o assassinato do presidente dos EUA George W. Bush em 19 Outubro. Usa imagens de arquivo para dar o sensacionalismo pretendido para o filme. Surf’s up, quando o mockumentário até já chegou ao cinema de animação. A história dos pinguins surfistas é contado pelo ponto de vista de uma equipa de filmagens que acompanham o torneio mundial de surf.
Este ano apareceram uma série de novos "mockumentários". Primeiro chegou-nos da Espanha REC, que conta a história de uma equipa de reportagem jornalística cobrindo o dia-a-dia dos bombeiros num dia em que são atacados por uma casa infestada por um vírus. Os Norte-americanos já tinham o seu remake a caminho, chamado Quarantined. Diary of the dead é o que seguiu, com a mesma temática de sempre nos filmes de Romero: Zombies. Nada de novo, portanto. Não contando com Cloverfield, que certamente popularizou ainda mais o estilo pretensamente ‘real’ entre o cinema 'mainstream'.
O Youtube tem difundido inúmeros casos de indivíduos que produzem semi-documentários sobre as suas vidas pessoais, profissões ou apenas o acidental dia-a-dia de qualquer um. É barato, fácil (ou assim parece) e dá protagonismo instantâneo a quem tem a sorte de receber o mediatismo esperado. Para fazer o seu mockumentário, basta para isso ter uma câmara de vídeo (a qualidade não interessa. Quanto menos definição obter, maior realismo obterá), muita criatividade e alguns amigos que o ajudem a teatralizar as situações.
E saibam também que …
Faux Documentary (Documentário falso), um irmão do Documentário e do Mockumentário. Adapta elementos característicos do documentário tradicional, como a câmara instável, narração, entrevistas com personagens, mas não reflecte totalmente o objectivo do formato documental. Não pretende ser uma versão documental do acontecimento, apresentando esse facto como facto real ao espectador, mas apenas dando um lado de ‘cinéma-vérité’ ao filme...
Se o Documentário dá o conhecimento de que há uma equipa de rodagem presente, o Faux-documentário raramente o faz, demonstrando cenas em que os actores fazem coisas que nunca fariam ou diriam se uma câmara estaria presente. Confuso? Basta para isso ver um episódio da série The Office para perceber a ideia. Curb Your Enthusiasm de Larry David começou com este formato, o que criou uma atmosfera demasiado perturbante para uma série de comédia.
Não confundir com:
Dogma 95, o movimento definido por Lars Von Trier e Thomas Vinterberg. Foi a criação de um cinema mais realista e menos comercial. Embora partilhem algumas das mesmas características, entre elas o uso de câmara e seu modo de filmar, ausência banda sonora, etc, há mais restrições nas regras criadas pelos dois cineastas. A proibição de efeitos e filtros, a obrigação de se passar em tempo real, entre outras limitações na sua produção tornam-no um movimento tão radical como intrigante.
Cinema de guerrilha: Consiste basicamente na forma de filmar “em cima do acontecimento”, com câmara ao ombro mesmo que isso afecte a estabilidade do plano. O objectivo é de dar o maior realismo à cena. Regra geral é ser utilizado em sequências de grande acção, tais como perseguições, cenários de guerra ou luta. Os casos mais flagrantes são nos formatos épicos, históricos e biográficos. Bloody Sunday, o Resgate do soldado Ryan e Children of men são bons exemplos disso.
Artigo publicado na TAKE nº0 de Fevereiro 2008