P2 é um pequeno filme de características muito peculiares. P2, parte da premissa de duas personagens. Duas apenas. Não precisou de muito mais para ter estreado nas salas. Mas não é o único. Esqueçam as multidões. Os mega épicos com centenas de figurantes e elencos recheados de estrelas cabotinas e pagas a peso de ouro. Por fora, encontram-se pequenas preciosidades, na sua maioria indie, que rejeitam qualquer número abusivo de actores em cena. E é com esta táctica que acertam em cheio. Um trunfo que parecendo inútil, evita perdas de tempo e acrescenta uma maior profundidade aos conflitos humanos.
É quando o cinema se serve de menos de meia dúzia. Trazem atrás um pequeno grupo de actores/figurantes que se contam pelos dedos de uma mão. É muito cinema independente à mistura, alguns blockbusters de grande qualidade a dar ao star-system uma grande lição de talentos. Daqueles ‘cabeças de cartaz’ que levam o filme às costas. Sem dúvida alguma que lhe reconhecemos o mérito, pelo maior grau de exigência.
Muitos projectos de iniciação de um qualquer realizador ou produções de baixo orçamento tomaram este sentido. Filmes como Le Dernier Combat, Solaris, The Edge, The Shinning e até o recente Wall-E apresenta poucos actores em cartaz. Sugerimos-lhe outros tantos filmes que poderão constatar que quantidade não é sinónimo de qualidade.
P2 (Franck Khalfoun, 2007)
(No parque subterrâneo: 2)
A dualidade de personagens. Homem versus Mulher. Psicopata versus vítima. O duelo joga a favor da complexidade psicológica. Com o medo e a obsessão frente a frente, a sobrevivência é o objectivo final. Clichés à parte, o thriller funciona sempre bem com estes confrontos. É o típico jogo do “gato e do rato”…
The Blair Witch Project (Daniel Myrick e Eduardo Sánchez, 1999)
(No bosque: 3)
O filme sensação de Sundance nesse ano, com apenas três actores amadores e com apenas algumas noções do que deveriam fazer durante os dias de filmagem, por sua conta e risco. Bruxas não as vemos (os realizadores trataram de sugerir essa “presença”), mas vemos o pânico e desespero do trio confrontados com o sobrenatural invisível.
A lagoa azul (Randal Kleiser 1980)
(Numa ilha deserta: 3)
Um navio afunda-se. Três sobreviventes escapam, um velho e duas crianças. Numa ilha perdida no oceano, ficam sós, para acasos do destino sobrarem apenas os dois jovens primos. A partir daí transforma-se como um “Sexta-feira ou a vida selvagem” romântico, um dueto amoroso que conta com a presença de Brooke Shields. Tribos canibais e marinheiros ingleses juntam-se à festa para dar uns toques de exotismo.
Duel (Steven Spielberg, 1971)
(Pela estrada fora: 2)
Homem versus Máquina. Embora o medonho camião tenha um condutor agressivo e excessivamente teimoso, a verdadeira presença é dada pelas toneladas de chapa metálica que perseguem o pobre automobilista. Quanto ao nosso camionista paranóico, na verdade só lhe vislumbramos um par de botas… Empregados de café, gasolineiros e condutores de domingo não são relevantes.
Hard Candy (David Slade, 2005)
(Em casa: 2)
Ellen Page impecável (e implacável) no thriller psicológico que ambíguo de quem domina quem, qual dos dois é o predador e a vítima. As mentes chocam, as hostilidades trocam de mãos de tempos a tempos, com apenas breves interrupções de alguns intervenientes. A desorientação moral torna a resolução do caso cada vez mais ambígua, ali mesmo fechados entre as paredes de casa. E é a respiração ofegante que faz de banda sonora.
Misery (Rob Reiner, 1990)
(Em casa: 2)
Kathy Bates e James Caan desenvolvem este thriller escrito por Stephen King, um mestre do horror, mas também e principalmente de emoções no limite. A loucura representada numa mulher, contrastando com a vulnerabilidade de um escritor preso no mesmo local, faz da premissa um verdadeiro desafio mortal. O isolamento provoca actos de acção/reacção, numa busca pela liberdade e sobrevivência.
Nothing (Vincenzo Natali, 2003)
(No meio do nada: 2)
Aqui outro caso em que os restantes participantes actuam como figurantes falantes. O filme está, todo ele, nas mãos da dupla. Dave e Andrew ficam sós no mundo por razões inexplicáveis, qual pedido concretizado, ao desejar o impossível. Combina-se neste lugar a frustração emocional e a própria existência é questionada. Muito metafísico, portanto. Rodeados do vazio total, o mundo real não se vislumbra nunca mais, quanto mais algum actor extra que porventura possa aparecer. Resumindo, para além desses dois, nada mais.
Gerry (Gus Van Sant, 2002)
(No deserto: 2)
Os créditos finais registam apenas dois nomes: Gerry e Gerry. Casey Affleck e Matt Damon abraçam este projecto minimalista, uma obra semi-experimental de Gus Van Sant. Perdidos no deserto, as emoções entram ao rubro ao constatar que a água acabou. É óbvio que se viram um contra o outro. A partir daqui, o foco central do filme passa-se dentro das suas cabeças, isoladas de uma vastidão desértica.
Open Water (Chris Kentis, 2003)
(No alto mar: 2)
Dois personagens, um cenário. O oceano imenso, sem terra à vista com apenas um casal de mergulhadores perdidos do restante grupo. Começaram com 20, que regressam sem dar conta de que esses dois ficarão o resto do filme por sua conta e risco. A companhia passa por alguns tubarões que rodeiam as quatro pernas dos dois azarados.
Cast Away (Robert Zemeckis, 2000)
(Numa ilha deserta: 1)
Ao contrário de Lost, por exemplo, que tem atrás de si um elenco brilhante e coesivo, este conta apenas com Tom Hanks, solitário numa ilha deserta. Um verdadeiro one-man-show. Logo por isso boa parte do filme passa por um reduzido número de diálogos, ou antes, monólogos. Mas, será que podemos considerar a bola Wilson como um personagem? De qualquer modo, esse não conta para o elenco...
I am legend (Francis Lawrence, 2007)
(Em Nova Iorque: 1)
Will Smith é Robert Neville, o último homem na Terra. Pelo menos ele assim supõe. A sua única companhia é a cadela Samantha e alguns manequins no videoclube. Posteriormente, surgem para surpresa dele, dois sobrevivente do vírus que dizimou a humanidade. Emma Thomson, mutantes e ‘flashbacks’ explicativos não contam para engrossar a lista…
Artigo originalmente publicado na TAKE de Maio 2008, edição nº 3.
3 comentários:
Que bela lista de filmes aqui colocaste :)
É surpreendente como existem verdadeiras obras primas feitas apenas com dois actores que agarram no sozinhos em quase 90% do filme como é o caso do Misery, do Hard Candy ou principalmente do one man show que é o Tom Hanks no Cast Away :)
O Nothing ou o Gerry nunca tive oportunidade de ver mas quem sabe se um dia o faça =)
Aqui fica a prova viva em como um bom argumento e um bom par de actores conseguem fazer as maravilhas de um realizador e principalmente dos cinéfilos sem ser preciso abusar de efeitos especiais ou de remakes... :P
Um abraço
Peter, vê o Nothing que vale a pena (e ganhou o Grande Prémio do Fantas nesse ano). O Gerry acho que podes dispensar :P
Abraço!
Tenho que rever o P2, depois de o ver fiquei com receio de parques de estacionamento.
Depois adorei o "Hard Candy": 4*
"Hard Candy" tem uma história bastante boa e um argumento muitíssimo bem escrito, portanto recomendo que vejam este filme algo perturbador.
Cumprimentos, Frederico Daniel.
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